domingo, 28 de agosto de 2011

Pensamentos que viajam de uma casa a outra

Brasília é uma cidade de três pessoas: eu, você, e alguém que um de nós conhece. Assim, todos sempre se encontram nas ruas, não importa o quão grande a cidade se pareça.

Sábado à tarde. Quermesse do Templo Budista em Brasília. Assim, encontrei-me ao não-acaso com um amigo de determinada crença religiosa, e discutíamos a beleza do interior do templo. Assim do nada, ele me colocou a seguinte pergunta: "você percebeu que o budismo, quando saiu da Índia e chegou ao Japão, teve muito do xamanismo japonês agregado a ele?"

Não lembro muito bem o que respondi, e meu conhecimento a respeito dos dois temas - budismo e xamanismo japonês - são demasiado superficiais para elaborar qualquer resposta profunda. Mas fiquei a divagar sobre a maneira como as idéias e concepções de Religião e Pensamento mudam sua arquitetura quando mudam de uma casa para outra.

Entrei no templo. Belíssima, a imagem do Buda Amida sorria em amarelo-ouro aos meus olhos cansados. E enquanto aguardava minha vez na fila, para depositar um pouco de incenso respeitoso à sua frente, aquele amarelo me atentou para um detalhe sobre a natureza das cores...

Nossa retina é capaz de distinguir quatro grupos de cores: amarelo, azul, verde e vermelho. Tudo o que nos rodeia só é visível porque possui "quantidades" dessas cores misturadas em diferentes proporções. Somos cegos a todas as outras. Assim, a imagem abaixo nos parece nítida, e nos fornece informações ricas.



Imaginemos uma viagem a um lugar onde as retinas das pessoas percebessem apenas a cor azul. Por mais que nos esforçássemos em mostrar a figura acima, e comentar da sua beleza e profundidade, essas pessoas veriam "apenas" isto:



O que não faz muito sentido, não é mesmo?

Sábio é aquele que sabe retocar a pintura do Universo, remontando as cores invisíveis em suaves nuances de azul, para que todos os que visitem sua casa vejam a beleza da imagem.

Não quero dizer que os buscadores diretos do Buda (ou Jesus, ou Lao Tsé, ou Krishna, ou Platão) percebam todas as cores, ou que os japoneses (ou espanhóis, indianos, brasileiros) sejam cegos para outras cores. Penso que a grande Pintura do Universo ainda não foi descortinada em sua exuberância completa, e que é necessário que o Sábio de cada povo, nação, pensamento, saiba pintar nas cores mais sensíveis à natureza de quem observará. E quando uma imagem muda de casa, naturalmente será percebida melhor se for adaptada à luz das janelas da casa para onde vai.



Assim, todos verão sua parte da pintura. Até o dia em que as cores não forem mais necessárias. Assim como as palavras só servem para transmitir idéias. "Quando as idéias são assimiladas, as palavras tornam-se desnecessárias." Como já escreveu Zhuang Tzu.

"Onde posso encontrar aquele que já esqueceu das palavras? É com ele que eu gostaria de conversar!"

Digo o mesmo das cores.

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